Nicole Mossoux: Encarnação | Um Presente

Kefar Nahum (FIMFA Lx13, Teatro Nacional D. Maria II, 2013)

Encarnação

Foi por causa da reparação do rosto de uma boneca de pano, uma actividade que me parecia da mais alta importância, e que exigia os meus cuidados mais atentos, que comecei a querer trabalhar num espectáculo, em que as figuras inertes ganhassem vida e se tornassem nos meus plenos parceiros. O espectáculo Twin Houses (1994) nasceu assim.

E de cada vez que me encontro a criar, na solidão, não consigo deixar de procurar um parceiro deste calibre, quer seja sombra, objecto ou, como actualmente, o som.

Sem dúvida que a questão da encarnação encontrou um eco especial na obra da nossa Companhia de Teatro-Dança, uma questão que não é alheia ao do direito de existir, a oportunidade de ser no mundo. Connosco há sempre como que uma flutuação entre o acto cénico e a sua encarnação, uma questão nesta frontalidade, com a qual nós confrontamos o espectador: estou realmente aqui? Que figura murmura dentro de mim? O que no interior ou no exterior me soa tão estranhamente familiar?

E estas figuras que animamos, que manipulamos, são a resposta inversa a estas perguntas. Elas levam-nos de barco, pela ilusão, de modo que somos obrigados a seguir as suas próprias regras, e a entranhar-nos um pouco no seu vazio, no seu mistério intrínseco.


Um Presente

Workshop O corpo face ao Objecto (FIMFA Lx13, Culturgest, 2013)

Foi durante a edição de 2013 do FIMFA.
Agnès Limbos e eu dirigíamos um workshop, "O corpo face ao objecto”. Infelizmente tive de deixar este projecto para ir ter com uma amiga de Bruxelas, que estava entre a vida e a morte. Pedi a Virginie Verdier - uma bailarina com quem colaboro, que continuasse o curso - para garantir a parte do "aquecimento corporal". 

No dia seguinte ao meu regresso a Bruxelas, recebemos, eu e a minha amiga Martine, esta foto, Agnès, Virginie e todos os alunos reunidos. Este gesto tocou-nos muito. Eles desculparam o facto de os ter deixado, e criou uma relação muito doce com Martine, que pouco depois nos abandonou.

Para mim (que venho do meio da dança), as pessoas das marionetas, dos objectos, têm uma disposição especial para a empatia. Será que é porque estão constantemente em contacto com formas inanimadas? Que têm este gesto de lhes dar vida?

Será preciso encontrar uma razão? Ou apenas um padrão de prazer e de gratidão...


BIO
Nicole Mossoux (BE): Coreógrafa, bailarina e encenadora. Dirige com Patrick Bonté a Cie Mossoux-Bonté. 
Participou no FIMFA com Twin Houses (Maria Matos Teatro Municipal, 2009), Kefar Nahum e Whispers (Teatro Nacional D. Maria II, 2013, 2015). Dirigiu com Agnès Limbos o workshop O corpo face ao objecto (Culturgest, 2013).