Neville Tranter: Uma Arte de Precisão


Vampyr (FIMFA Lx9, Teatro Nacional D. Maria II, 2009)

O primeiro momento em que uma marioneta de luva é colocada na minha mão, é para mim um momento mágico. É o momento em que se dá vida a uma marioneta. A técnica básica é bastante simples. Pausa, movimento e depois pausa novamente. Parece simples, mas quando se começa a considerar o tempo que a pausa deve ter, qual o tipo de movimento e qual a direcção de que precisa, torna-se numa coreografia. E com uma coreografia há sempre ritmo com variações infinitas. É necessário aprender a dominar o ritmo para se ser capaz de revelar o carácter da marioneta e as suas motivações. A primeira habilidade, porém, é aprender a olhar através dos olhos da marioneta. A marioneta ganha vida quando o público vê a marioneta pensar. Porque quando a marioneta pensa, tem consciência da sua situação ou do que a envolve e isso torna-a humana. Os nossos olhos acompanham sempre o movimento e é por isso que seguimos a marioneta, conforme esta descobre ou reage ao que está à sua volta. E uma marioneta reage sempre e constantemente ao que a rodeia, combinando movimentos e pausas.

A partir do momento em que a marioneta entra no palco, o público acompanha o seu olhar. Esta "linha" simples que os olhos da marioneta seguem é uma linha que pára e começa, faz novamente uma pausa, muda o ritmo, salta, cai, pára, pensa, e finalmente sai. Cada movimento ou não-movimento conta uma história, revelando o carácter e informações num diálogo ininterrupto com o público. Criar este diálogo significa seleccionar as imagens que são necessárias para contar a história, mas deixando espaço suficiente para o público usar a sua própria imaginação. Eu nunca percebi o quão precisos eram os movimentos da marioneta, até que tive de ensinar. Um ou demasiados movimentos podem destruir uma imagem inteira. O público ao assistir a um bom espectáculo de marionetas acompanha as suas acções como se fosse a coisa mais natural do mundo. Mas por trás das acções da marioneta está uma coreografia rigorosa de movimentos e pausas, dirigidos por ritmos e pela respiração, visualizando imagens no palco para dar ao público uma verdadeira experiência teatral. O teatro de marionetas é para mim uma arte de precisão.


BIO
Neville Tranter (NL): Actor, marionetista e encenador. Director Artístico da companhia Stuffed Puppet Theatre. 
Participou no FIMFA com Vampyr (Teatro Nacional D. Maria II, 2009), Punch & Judy in Afghanistan (Museu da Marioneta, 2012), Mathilde (Museu da Marioneta, 2013). Dirigiu dois workshops intitulados O Poder da Marioneta (Museu da Marioneta, 2006, Teatro Nacional D. Maria II, 2009)