Kalle Nio: A Magia e o Teatro de Marionetas


Lähtö / Départ (FIMFA Lx14, São Luiz Teatro Municipal, 2014)

O falecido mestre de magia Tommy Wonder escreveu sobre um truque chamado Zombie. O Zombie é um número clássico de magia. É um truque em que uma bola prateada parece flutuar por cima e por baixo de um pano que o mágico tem nas mãos. É um truque que nas mãos de um artista habilidoso pode ser um milagre ver como a bola vive e flutua, mas nas mãos erradas, pode parecer o que é essencialmente, uma bola ligada a uma vara que o mágico move, atrás de um pano.

O pano esconde o segredo do público, mas a vara não é o segredo. A vara apenas impede que a bola caia. A magia não acontece nas mãos mágicas. A magia acontece na mente dos espectadores. O verdadeiro segredo é a forma como o mágico a move, actua e como tudo nos é apresentado. Se retirarmos o pano do truque, nas mãos certas ainda cria a ilusão de uma bola viva e flutuante, independentemente de podermos ver ou não a vara. Isto será teatro de marionetas. Portanto, aqui temos a diferença entre a magia e o teatro de marionetas. Na magia precisamos de um pano, mas não nas marionetas. Com as marionetas, quando tudo é feito correctamente, temos uma ilusão, mesmo sem um segredo. Nas mãos erradas, não importa se há um pano ou não, vai ser apenas uma bola e uma vara, não é magia, não é teatro. Se for bem feito, as pessoas vão querer acreditar na ilusão. Quando existe esta capacidade de acreditar, há pessoas que ouvem. O que vamos dizer? Qual o ponto de vista que vamos escolher?

Com a magia, o problema é que se está a esconder o segredo do público. No caso de se esconder alguma coisa, as pessoas vão querer saber o que é que está escondido. Isto torna muito difícil para o público concentrar-se em qualquer outra coisa. O problema é que o segredo geralmente não tem nada de interessante, é apenas uma vara ou algo parecido. Assim, para mim, a questão, muitas vezes, é qual o valor do secretismo ou este serve apenas para distrair o público? Pode haver magia no teatro dramático, ou será que a magia associada a outro tema, pode transformá-lo automaticamente em teatro de marionetas ou teatro visual, ou algo semelhante. É possível comunicar algo com a magia? Algo mais do que apenas a sensação de espanto. Serão as marionetas magia sem segredos? E o que é mais interessante, surpreender ou comunicar? E todos estes rótulos e definições de formas de arte... Será que importa o que é? Vejo que estou a pensar muito nestas coisas, mas na verdade, nunca me importei muito com o rótulo em que estou inserido. Por vezes, é magia, às vezes teatro ou cinema, ou circo... seja o que for, se algo é interessante, isso é suficiente para mim.

Ao longo dos anos, o FIMFA teve uma enorme variedade de diferentes tipos de espectáculos, diferentes campos de trabalho, mas o principal é que sempre foi interessante. No FIMFA sempre me senti em casa. Obrigado por todos os anos e feliz aniversário FIMFA!


BIO
Kalle Nio (FIN): Mágico, artista visual, encenador e intérprete. É director artístico da companhia WHS.
Participou no FIMFA com Keskusteluja (Maria Matos Teatro Municipal, 2010), Nopeussokeus - Speed Blindeness (Museu da Marioneta, 2011), Lähtö / Départ (São Luiz Teatro Municipal, 2014).